09 agosto 2006

As Árvores lá de Casa, eu e Papai voamos.

Os abacateiros eram o mais impressionantes, enormes e frondosos. Na época dos frutos era tanta quantidade, que tinhamos abacates para alguns meses. Vitamina de abacate, abacate amassado com o garfo, abacate na salada, sorvete de abacate. Sobrava abacate lá em casa e até dávamos aos vizinhos.

Tinha uma goiabeira que não era muito grande. Dava poucos frutos, nunca soube o porquê. O melhor da goiabeira era seus galhos retorcidos. Pois minha irmã, Rita, na época do natal, escolhia um galho, pintava-o de cor prata e o transformava em uma árvore de natal. Ficava linda. A decoração da árvore era feita de algodão, para imitar a neve, e de bolas vermelhas, daquelas que ao cairem no chão se espatifavam e nos entristeciam. Hoje em dia as bolas quando caem no chão, em vez de quebrar, saem pulando para alegria dos meus filhos e meu espanto.

Os coqueiros eram dois, da espécie anão, segundo meu pai. Não entendia bem por que anão. Afinal quando me dei por "gente" eles eram enormes, ao contrário de anão. Aprendi cedo a escalar os coqueiros. Subia neles rapidamente, como se estivesse de cócoras, firmando bem os pés, sem ajuda de corda. Apenas com um camisa para amenizar o contato do meu peito com o caule, cheio de irregularidades e que me arranhavam bastante ao subir. Os mais verdes produziam água de coco em demasia. Os maduros nós os abríamos e comíamos, às vezes ralavámos e fazíamos cocada, era uma delícia.

Um dia plantamos um ingazeiro. Que fruto delicioso é o ingá. Parece uma vagem miúda e mais encorpada. Uma vizinha tinha uma árvore e foi lá que eu conheci o ingá. Dentro têm várias sementes envoltas em uma espécie de "algodão", branco, doce e incrivelmente gelado. Em poucos anos o nosso ingazeiro cresceu absurdamente e ficou maior do que o da vizinha. E como dava frutos, enchíamos baldes e baldes de ingá. Por ter ajudado a plantá-lo eu considerava o ingazeiro como meu, o meu pé de ingá, como era do Gum o seu pé de laranja lima, no livro de José Mauro Vasconcellos.

Papai, em uma ocasião, subiu no meu pé de ingá para podar alguns galhos que invadiam a casa do vizinho. Ele subiu rapidamente e atingiu o ponto da poda. Levava consigo uma cordinha, a qual eu, lá de baixo, amarrava um serrote e meu pai puxava, para podar a árvore. Neste dia, após efetuar seu trabalho, papai se preparava para descer. O tempo deu uma brusca virada e começou a ventar forte. Meu pai soltou o serrote lá de cima, para poder se segurar melhor. Eu, lá de baixo, olhava maravilhado o balanço que o vento fazia na árvore. Meu pai ia de um lado a outro ao sabor dos fortes ventos, como se estivesse voando. Eu fiquei fascinado com a cena. Ao descer comentei com ele:
- Pai, que legal você voando!
- Legal, meu filho? Eu fiquei com medo lá em cima, pensei que o galho fosse partir e eu cair...

Tempos depois eu passei por uma situação semelhante. Eu vivia no meu pé de ingá. Um dia, depois de ter ficado bastante tempo lá em cima, olhando os paraquedistas pularem dos aviões, no Campo dos Afonsos, começou a ventar forte. Agora era eu que ía de um lado para outro. Fiquei paralisado e me agarrei o máximo que eu pude no galho, para não cair. Eu estava voando também, como o meu pai. O vento aumentava e começei a ficar com medo, medo de cair e me arrebentar lá embaixo. Finalmente consegui descer e senti o mesmo que meu pai sentiu lá em cima. Mas estranhamente eu estava feliz, muito feliz. Durante breves momentos eu tinha voado... igual ao meu pai.